Os portugueses nascem convencidos de que todos os seus males se devem aos políticos ou aos ricos, em especial aos banqueiros.
Essa tese, se é plausível e sustentável, é também cómoda e
desculpabilizadora. É preciso cada um assumir as suas próprias
responsabilidades. Nunca podemos esquecer que, por muito maus que sejam,
os dirigentes políticos e económicos vivem da boa vontade dos seus eleitores ou clientes. No final, precisamente por serem quem são, as massas determinam todos os outros aspectos.
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A verdadeira origem do colapso financeiro está num aparelho produtivo que não gera riqueza suficiente para pagar as suas contas.
(...)
as dificuldades nanceiras de Portugal não estão, antes de mais, na
banca, no Estado ou em alguns sectores particulares. Elas representam
uma característica de toda a economia. Os graus são diferentes, mas o problema é comum.
(...)
Não há capital por duas razões. A primeira é que o povo não poupa.
Como vimos, a taxa de poupança das famílias portuguesas, que no início
deste ano passado estava em 3,3%, situa-se no registo mais baixo da
nossa história, e é um dos valores mais baixos da União Europeia – cerca
de um terço dos países com quem nos gostamos de comparar. Sem ovos não
se fazem omeletes, e esta razão chega e sobra para que em Portugal não
haja capital. O nosso país, que há duas gerações era campeão mundial da
poupança, mudou de hábitos e gasta o que tem e o que não tem, sem pensar
no futuro. Assim não pode haver capital. É crucial notar que esta
razão, de longe a mais importante, nada tem a ver com políticos,
empresários ou banqueiros. É o povo, todo o povo, que toma uma atitude
de consumidor e devedor em vez de aforrador e investidor.
(...)
Existe outro motivo para a nossa situação, que tem a ver com o mau uso do pouco capital que temos e a incapacidade de atrair capital alheio.
Aí podemos assacar culpas a governos envolvidos em despesas
improdutivas, banqueiros que emprestaram a projectos tontos ou
especulativos, e empresários sem visão ou capacidade. Todos eles,
acusados por tantos dos nossos males, são justamente condenados, mas não
constituem o elemento determinante que, de algum modo, está também por
detrás deles. Porque foram as populações perdulárias que elegeram e
apoiaram os governos esbanjadores e eram clientes dos projectos vácuos e
de empresários incompetentes. A culpa de Portugal não ter capital é dos portugueses. Todos.
Quando
não há poupança, a solução é usar crédito. Foi isso que as nossas
empresas e famílias, além do Governo, fizeram durante duas décadas,
acumulando uma das maiores dívidas mundiais. Crédito parece, mas não é,
capital. Pode ser uma forma temporária de aceder a fundos que,
aplicados de forma produtiva, se venham a transformar em capital. Mas
uma abundância acumulada com dívida tem um perigo evidente. Precisamente
aquele que hoje nos assola.
é urgente fazer uma transformação profunda e radical na
estrutura da nossa economia para romper bloqueios, eliminar privilégios,
lançar dinamismos. Sem transformar seriamente o quadro geral,
esperam-nos décadas de marasmo.
“As 10 Questões do Colapso. Portugal: a provável derrocada financeira de 2016-2017”,
Prof. César das Neves
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