Na conferência organizada pelo PS, no passado dia 25 de Setembro, e que contou com a presença do próprio Primeiro-Ministro, um dos convidados, o Dr. Rui Moreira, Juíz, membro do Conselho Superior de Magistratura manifestou aquilo que vai na alma de muitos dos que lidam diariamente nos tribunais com litígios familiares envolvendo divórcios, regulação do exercício do poder paternal e partilhas. Não é, aliás, de estranhar que a comunidade jurídica, na sua maioria demonstre a sua preocupação.
Antes de mais, há que levar em consideração que os tribunais de família, neste momento, já se encontram, na sua maioria, entupidos. A isso há que acrescentar o facto destas matérias serem, por natureza, altamente conflituosas e onde as partes, já de per si, muitas vezes, procuram intencionalmente prolongar os litígios.
Diríamos, então, que perante este quadro já, à partida, problemático, a missão do legislador sensato, deveria ser a de legislar de forma a evitar que as partes usem o conflito judicial como forma de expressão dos seus conflitos de ordem emocional ou patrimonial.
Sucede que olhando para a nova lei do divórcio, a maioria dos operadores judiciários ficam estupefactos pela quantidade de novas possibilidades de litígio que passam a existir, potencializando o agravamento do litígio judicial. Desde logo na sua redacção, pelo recurso a expressões vagas e indeterminadas, tais como “Quaisquer outros factos que, independentemente da culpa dos cônjuges, mostrem a ruptura definitiva do casamento” (Artº 1781, d) CC) ou “actos da vida corrente”, “orientações educativas mais relevantes” ou “questões de particular importância) (Art. 1906 nº2, 3 e 4CC), entre outros.
Ora, estas expressões sobre as quais a jurisprudência dos tribunais superiores terão que se pronunciar, levarão a julgamentos e recursos infindáveis e provavelmente só daqui a muitos anos é que haverá uma linha definida sobre o seu contéudo. Até lá, serão muitos os casais, os pais e os filhos que sofrerão na pele as consequências desta legislação precipitada e experimentalista.
Quanto à questão do divórcio litigioso com declaração de culpa de um dos cônjuges é importante que se saiba que o mesmo, neste momento, não representa mais do que 6% do total dos divórcios. No entanto, a manutenção do seu regime era importante por ser aquele que melhor salvaguardava, ao nível da fixação de uma pensão de alimentos ou quanto à repartição dos bens comuns, situações graves de violação unilateral dos deveres conjugais.
No caso de divórcio com consentimento mas onde não há acordo quanto aos bens comuns ou à regulação do exercício do poder paternal ou à atribuição da casa de morada de família, a nova lei prevê que seja o tribunal a decidir sobre estas questões, devendo, se for caso disso, ser produzida prova (novo artigo 1778º-A, nº4 do Código Civil). Ora, isto é uma autêntica loucura que só vai atrasar e tornar ainda mais penoso o decretamento do divórcio precisamente porque este só poderá ser decretado após todas essas questões estarem resolvidas (Cfr. nº5 do artigo 1778º-A do Código Civil). Desta forma, a nova lei que tem o propósito de tornar mais rápido o divórcio, vai precisamente, em alguns casos, tornar o divórcio ainda mais demorado.
Por outro lado há ainda a destacar o facto da nova lei penalizar, por ex. a mãe, com pena que pode ser de prisão no caso do seu filho de 10 ou 11 anos não queira estar com o pai por razões pessoais. Isto vai implicar uma enchente de queixas-crime. Resta-nos esperar pelo bom senso dos Magistrados para, nos tribunais, tentarem remediar tantos dislates.
Uma coisa é certa, quem fez a lei, não faz a mínima ideia do que é a prática judicial
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