sexta-feira, 24 de novembro de 2006

A CRISE DO ESPANTO

O “Espanto” era considerado, por Aristóteles, um dos grandes filósofos de todos os tempos, como o primeiro passo para que qualquer homem pudesse iniciar-se no desejo pelo conhecimento de algo.
Quem se espanta, dizia o filósofo grego, deslumbra-se, e isso leva-o a interrogar-se, e da interrogação surge a busca por conhecer aquilo sobre o qual se espantou.
Durante muitos séculos esta foi basicamente a atitude fundamental do Homem, nas mais diversas vertentes da sua actividade. O espanto era a origem dos mais diversos movimentos e reacções individuais ou de massas Por causa dele, desenvolviam-se teorias científicas, aceitava-se com fé as opções religiosas propostas, surgiam convicções políticas, e morria-se por ideais.
Com a revolução industrial, porém, o Homem foi-se tornando cada vez mais auto-suficiente. A saúde, o dinheiro e o bem estar passaram a dominar as suas preocupações. Por isso também, o individualismo e o egoísmo passaram a ser a nota preponderante.
O espanto, enquanto atitude fundamental e primária do conhecimento humano, passou a ser progressivamente substituído por outra atitude: a da angústia. Agora, o Homem trabalha com o único objectivo de lutar contra a angústia da morte, da doença e das más condições de vida. Desde a ciência, passando pelos grandes movimentos sociais, e terminando nos argumentos dos principais best-sellers de livros, CD’s e filmes, tudo anda, agora, à roda da angústia da vida.
O espanto entrou em crise, e quase que morreu, subsistindo apenas, aqui e ali, em bolsas de resistência muito localizadas, muitas vezes, ao serviço da própria angústia.
Uma dessas bolsas de resistência, curiosamente, é a publicidade. Na ânsia de querer vender saúde e bem estar, a publicidade, com o apoio de modernas técnicas de marketing, relembra aos consumidores que há coisas que ainda têm capacidade para nos espantar, como o rir de um bébé, ou uma paisagem bonita, ainda que seja para depois vender umas fraldas ou uma estadia numa pousada.
Parece-me que o desafio dos nossos tempos e, em especial, do nosso século XXI, está precisamente em conseguir com que cada um consiga equilibrar a angústia com o espanto. Negar o primeiro é recusar viver no mundo presente, mas esquecer o segundo é correr o risco de passar ao lado do que, se calhar, pode vir a ser o mais importante.
Por isso, espantem-se!!!

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