sexta-feira, 24 de novembro de 2006

OS TÁVORAS

A RTP, desde há algum tempo, tem vindo a divulgar algumas novelas históricas da autoria de Francisco Moita Flores. A meu ver a que de longe mais se destacou pela sua qualidade e até interpretação dos actores foi a do “Processo dos Távoras” (2001), embora em abono da verdade “Capitão Roby” (2000) e “Alves dos Reis” (2000), ambos do mesmo autor também se tenham destacado pela positiva.
Para quem não sabe ou não se recorda, os Távoras e os Duques de Aveiro, ligados por laços familiares eram uma poderosa família de meados do século XVIII que representavam a força da antiga nobreza ligada a uma forte tradição conservadora e intimamente ligada aos Jesuítas.
O episódio que os condenou à morte teve a ver com um atentado que El Rei D.José I sofreu numa das suas investidas amorosas nocturnas. O processo judicial foi rápido e eivado de irregularidades. Mais tarde no reinado de D.Maria procedeu-se a um inquérito rigoroso, tendo-se provado que à excepção do Duque de Aveiro, D.José de Mascarenhas, todos os outros eram inocentes. Diga-se, porém, que a hipótese de um assalto comum efectuado por ladrões numa rua secundária e mal frequentada de Lisboa também nunca foi totalmente posta de lado.
O episódio histórico é marcante por duas razões. Por um lado, porque estas famílias que foram chacinadas representavam aquilo que de mais digno havia na nobreza, com especial destaque para a Marquesa Leonor de Távora, mulher de grande categoria humana. Todos eles tinham já dado provas de grande devoção e lealdade ao Rei. O seu pecado original residiu no facto de serem para o Marques de Pombal uma “força de bloqueio” às suas reformas e ideias.
O debate e litígios políticos são lícitos desde que ambas as partes se respeitem mutuamente. Neste caso, o Marquês de Pombal resolveu o problema das suas forças de bloqueio através da incriminação de toda uma família, incluindo mulheres e crianças, muitas das quais só foram salvas pelo pedido de clemência da Rainha e da sua filha,
Por outro lado, as mortes foram executadas com requintes de crueldade, com torturas dolorosas, algumas públicas, feitas momentos antes da sua decapitação, posterior queima dos corpos e lançamento das respectivas cinzas ao rio Tejo.
O palácio do Duque de Aveiro, perto do local onde os Távoras foram barbaramente mortos e publicamente humilhados fica nas traseiras do tradicional café dos “Pastéis de Belém”, em Belém, aí existindo inclusive ainda hoje uma coluna cilíndrica que marca este triste episódio da nossa história.
Numa altura em que se discute assuntos como tolerância religiosa, respeito pelos pensamentos religiosos e políticos de outros membros da nossa comunidade, liberdade de criação e expressão, penso que seria bom termos como referência este episódio horripilante. Aqui o debate de ideias foi subordinado à violência e à manipulação política de um homem, Sebastião José de Carvalho e Melo que teve tanto de genial quanto de odioso e que não olhou a meios para atingir os seus fins.
Portugal tem uma dívida para com esta família, da qual ainda hoje existem descendentes vivos, aqui e no Brasil.
Já que hoje em dia se comemora tanta coisa, penso que seria vantajoso que, quer os manuais das nossas Escolas, quer o calendário político anual consagrassem o espaço merecido à reflexão e à recordação destes acontecimentos.

1 comentário:

volleyman disse...

Se não existem lugares no nosso calendário para comemorar homens como o Marquês de Pombal, o Mouzinho da Silveira e outros igualmente empreendedores (embora nem sempre amados por todos), porquê comemorar o que de mais conservador representa o nosso país? No fundo será apenas uma comemoração do sistema vigente: uma corja de afortunados, que sem grande mérito quer académco, quer profissional e menos ainda de formação humanitária vai governando a seu bel-prazer este país à beira-mar planatdo.
Não concordo com esta homenagem (alguém quer um domínio jesuíta ultra-conservador no poder? Já não nos chega Opus Dei?) Desculpem lá mas para este peditório eu não dou!