A vitória anunciada e antecipada do “sim” leva-nos a fazer, entretanto, um balanço sobre o que, a meu ver, foi o lado positivo e o negativo deste referendo, ainda que o faça, assumindo a minha qualidade de mandatário do Grupo Cívico “Algarve pela Vida”.
Positivo, penso que foi toda a mobilização da sociedade civil, em especial dos entusiastas pelo “sim” e pelo “não que, com grande entusiasmo e motivação lutaram pelas suas causas, muitas vezes, com sacrifícios das suas vidas pessoais, familiares e profissionais.
Positivo, foi igualmente o facto de se ter discutido, na rádio, nas tvs, nos jornais, em debates nos mais variados e recônditos, sítios um problema “silencioso” que existia, existe e que, infelizmente, vai continuar a existir, uma vez que após as 10 semanas o aborto vai continuar a ser crime para a mulher que o praticar.
Positivo, em concreto aqui no Algarve, não posso deixar também de considerar o grupo de activistas que fizeram parte do movimento “Algarve pela Vida”. Foi um grupo muito heterogéneo, composto por pessoas dos mais diversos partidos CDS/PP, PSD e até PS e por pessoas de convicções religiosas diferentes, católicas, evangélicas e até não crentes. Todas unidas pela convicção de que a vida é um bem supremo e que todos, em conjunto, poderíamos apoiar o seu crescimento em ambientes familiares e económicos adversos, fazendo-a florescer e desabrochar de forma bem sucedida.
Negativo, foi sem dúvida a atitude pouco democrática manifestada por muitos adeptos do “sim” que promoveram actos de vandalismo contra os cartazes e faixas do nosso movimento, ora danificando-os, ora fazendo-os desaparecer. Isto já para não falar na atitude de vários agentes da administração pública algarvia que, no pleno exercício das suas funções, procuraram fazer campanha pelo “sim” sem olhar a meios. Em particular, o mais grave foi o da Coordenadora da sub-região de Saúde de Faro, Lurdes Guerreiro que enviou, através do correio electrónico da Administração Regional de Saúde do Algarve uma mensagem apelando ao voto e sugerindo que todos os funcionários, médicos e enfermeiros dos centros de saúde subscrevessem um texto de apoio incondicional ao aborto livre. A gravidade da situação, aliás, levou a que a Comissão Nacional de Eleições tivesse já remetido o assunto para o Ministério Público de Faro.
Negativa foi a excessiva governamentalização da campanha e a chantagem inadmissível do primeiro-ministro José Sócrates que, repudiando uma proposta alternativa de despenalização total do aborto apresentada pelo movimento “Independentes pelo não” e apoiada pelo PSD, optou por insistir numa pergunta enganadora e que vai manter o problema do aborto clandestino e da penalização das mulheres para além das 10 semanas, fugindo de verdadeiras opções de apoio à mulher porque essas implicam despesa e aumentariam o déficit do Orçamento de Estado.
Positivo foi o comportamento da Rádio Renascença que assumindo editorialmente o seu apoio ao “não”, depois, durante a campanha, manteve um pluralismo exemplar, divulgando com frequência as posições e actividades dos partidários do “sim” e ainda, a nível local, o pluralismo manifestado pelo “NOTICIAS DE S.BRÁS” que, sem nenhum tipo de censura ou reparo, publicou vários artigos a favor do sim e do não.
Infelizmente, o mesmo já não posso dizer de uma parte da comunicação social privada quer nacional, quer regional que, de forma indecorosa e manifesta, promoveu uma autêntica campanha a favor do “sim”. Por uma questão de honestidade intelectual deveriam ter assumido a mesma postura da Rádio Renascença e declarado a sua posição oficial, em vez de fingirem que eram pluralistas quando os seus noticiários e programas revelavam precisamente o contrário. Só a título de exemplo, menciono aqui um semanário regional algarvio onde contabilizei, nada mais, nada menos do que 4 noticias pelo “sim” e apenas meia noticia do “não”, com uma breve referência fugaz, a propósito de um debate onde todo o destaque era dado à parte contrária.
Estes episódios sirvaram para reforçar ainda mais a minha já anterior convicção de que estamos muito longe da Democracia pluralista e humanista que era suposto ter resultado do 25 de Abril.
Quanto ao futuro, resta-nos esperar e desejar que o egoísmo e utilitarismo que grassa pela Europa Ocidental ao qual agora aderimos não nos leve à carnificina do aumento progressivo de abortos “por dá cá aquela palha”.
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